A magia muda realmente a natureza das coisas ou, antes, modifica à sua vontade as aparências, conforme a força de vontade do operador e a fascinação dos adeptos aspirantes. A palavra cria a sua forma, e, quando uma personagem, reputada infalível, deu a alguma coisa um nome qualquer, transforma realmente esta coisa na substância significada pelo nome que lhe dá. A obra - prima da palavra e da fé, neste gênero, é a transmutação real de uma substância cujas aparências não mudam. Se Apolônio tivesse dito aos seus discípulos, dando - lhes um copo cheio de vinho: “Eis aqui o meu sangue que bebereis, para sempre, a fim de perpetuar a minha vida em vós ”, e se os discípulos tivessem, durante séculos, acreditado continuar esta transformação, repetindo as mesmas palavras, e, tomando o vinho, apesar do seu cheiro e sabor, pelo sangue real, humano e vivo de Apolônio, seria necessário reconhecer este mestre de teurgia como o mais hábil dos fascinadores e o mais poderoso de todos os magos. Só nos falta adorá- lo.
É sabido que os magnetizadores dão a água, todos os sabores que lhes agradam, para os seus sonâmbulos e se supusermos um magista assaz poderoso sobre o fluido astral para magnetizar ao mesmo tempo uma assembléia de pessoas, aliás preparadas por uma sobreexcitação suficiente, facilmente explicaremos, não o milagre evangélico de Cana, mas outras obras do mesmo gênero.
As fascinações do amor, que resultam da magia universal da natureza, não são verdadeiramente prodigiosas e não transformam, realmente, as pessoas e coisas? O amor é um sonho de encantamentos que transfigura o mundo: tudo se torna música e perfumes, tudo se torna embriaguez e felicidade. O ente amado é belo, é bom, é sublime, é infalível, é resplandecente; irradia a saúde e o bem - estar... E, quando o sonho se dissipa, a pessoa julga cair das nuvens; vêm com desgosto a feiticeira imunda que tomou o lugar da bela Melusina, Tersita que era tomado por Aquiles ou Nereu. Que não seria possível fazer crer à pessoa pela qual somos amados? Mas, também, que razão e que justiça podemos fazer entender aquela que já nos ama? O amor começa por ser mago e acaba por ser feiticeiro. Depois de ter criado as mentiras do céu na terra, realiza as do inferno; o seu ódio é tão absurdo como o seu entusiasmo, porque ele é passional, isto é, submetido a influências fatais para si. É por isso que os sábios o proscreveram, declarando - o inimigo da razão. Os sábios eram dignos de inveja ou de lástima, quando condenavam assim, sem o ter ouvido, o mais sedutor dos culpados? Tudo o que se pode dizer é que, quando falavam assim, ainda não tinham amado ou não amavam mais.
As coisas são, para nós, o que o nosso verbo interior as faz serem. Julgar- se feliz é ser feliz; o que estimamos torna- se precioso em proporção da própria estima: eis como se pode dizer que a magia muda a natureza das coisas. As Metamorfoses de Ovídio são verdadeiras, mas são alegóricas como o asno de ouro do bom Apuleio. A vida dos seres é uma transformação progressiva da qual se pode determinar, renovar, conservar por maior tempo ou destruir mais depressa as formas. Se a idéia da metempsicose fosse verdadeira, não se poderia dizer que a depravação figurada por Circe muda real e materialmente os homens em porcos, porque os vícios, nesta hipótese, teriam por castigo a queda nas formas animais que lhe são correspondentes? Ora, a metempsicose, que foi muitas vezes mal entendida, tem um lado perfeitamente verdadeiro; as formas animais comunicam as suas impressões simpáticas ao corpo astral do homem, e logo se refletem nas suas feições, conforme a força dos seus costumes. O homem de uma brandura inteligente e passiva toma as aparências e a fisionomia inerte de um carneiro; mas, no sonambulismo, não é um homem de fisionomia de carneiro, é um carneiro que a pessoa vê, como o experimentou milhares de vezes o extático e sábio Swedenborg. Este símbolo está expresso no livro cabalístico do vidente Daniel, pela lenda de Nabucodonosor transformado em animal, que cometeram o erro de tomar por uma história real, como aconteceu com quase todas as alegorias mágicas.
Assim, podemos mudar, realmente, os homens em animais e os animais em homens; podemos metamorfosear as plantas mudar a sua virtude; podemos dar aos minerais propriedades ideais: só se trata de querer.
Podemos, igualmente, à vontade, fazer- nos visível ou invisível, e explicaremos aqui os mistérios do anel de Gyges.
Não notamos, muitas vezes, que, sob o domínio de uma forte preocupação, olhamos sem ver, e que vamos chocar -nos contra objetos que estavam diante dos nossos olhos? “Fazei que, olhando, não vejam ”, disse o grande iniciador; e a história deste grande mestre nos conta que, um dia, vendo - se a ponto de ser lapidado no templo, fez - se invisível e saiu.
Uma destas figuras representa o ciclo do movimento universal harmônico e equilibrado no ser imperecível; a outra, que deve ser feita do amálgama dos sete metais, merece uma descrição particular. Deve ser um duplo castão e duas pedras preciosas, um topázio constelado pelo sinal do sol, e uma esmeralda com o sinal da lua; interiormente, deve trazer os caracteres ocultos dos planetas e, exteriormente, os seus sinais conhecidos, repetidos duas vezes e em oposição cabalística uns com os outros, isto é, cinco à direita e cinco à esquerda, os sinais do sol e da lua resumindo as quatro inteligências diversas dos sete planetas. Esta configuração outra coisa não é senão um pantáculo que exprime todos os mistérios do dogma mágico, e o sentido simbólico do anel é que, para exercer a onipotência de que a fascinação ocular é uma das provas mais difíceis a dar, é preciso possuir toda a ciência e saber fazer uso dela.
Para exercer este poder é preciso ter uma vontade habituada aos atos enérgicos e repentinos, uma grande presença de espírito e uma não menor habilidade em fazer nascer distrações na multidão. Por exemplo: que um homem perseguido por assassinos, depois de se ter lançado numa travessa, se volte imediatamente e venha, com fronte calma, diante dos que correm atrás deles ou se misture com eles e pareça ocupado no mesmo fim, certamente ficará invisível. Um padre, que perseguiam em 93 para enforcá - lo, dobra rapidamente uma rua, aí tira a batina e se inclina no canto de um muro na atitude de um homem preocupado. A multidão dos que o perseguiam chega imediatamente: ninguém o vê, ou melhor ninguém o reconhece; era muito pouco provável que fosse ele!
A pessoa que quer ser vista sempre se faz notar, e aquela que quer ficar despercebida esvai - se e desaparece. A vontade é o verdadeiro anel de Gyges; é também a baqueta das transmutações, e é formulando - se clara e fortemente cria o verbo mágico. As palavras onipotentes dos encantamentos são as que exprimem este poder criador das formas. O tetragrama, que é a palavra suprema da magia, significa: “É o que será ”; e, se o aplicarmos a qualquer transformação e o fizermos com uma completa inteligência, ele renovará e modificará todas as coisas, até a despeito da evidência e do senso comum. O hoc est do sacrifício cristão é uma tradução e uma aplicação do tetragrama; por isso, esta simples palavra opera completo, a mais invisível, a mais incrível e a mais claramente afirmada de todas as transformações. Uma palavra dogmática mais forte ainda do que a de transformação foi julgada necessária pelos concílios para exprimir esta maravilha: é a de transubstanciação .
As palavras hebraicas:
Uma outra lenda refere que um santo, cujo nome não me vem à memória, achando para comer só uma ave, na quaresma ou numa sexta- feira, ordenou a esta ave que se tornasse peixe e fez dela um peixe. Esta parábola não necessita comentário, e nos lembra uma bela passagem de Santo Esperidião de Tremithonte, o mesmo que evocava a alma de sua filha Irene. Um viajante chegou, no próprio dia da sexta -feira santa, à casa deste bom bispo, e como, naquele tempo, os bispos, tomando o cristianismo a sério, eram pobres, Esperidião, que jejuava regularmente, só tinha em sua casa toucinho salgado que era preparado antecipadamente para o tempo pascal. Todavia, como o estrangeiro estivesse extenuado de fadiga e de fome, Esperidião apresentou- lhe esta carne e, para lhe dar coragem, sentou- se à mesa com ele e partilhou esta refeição de caridade, transformando, assim, até a carne que os israelitas consideravam como a mais impura, em ágapes de penitência, pondo - se acima do material da lei pelo espírito da própria lei e mostrando - se um verdadeiro e inteligente discípulo do Homem-Deus, que estabeleceu seus eleitos reis da natureza nos três mundos.
...
"Creio na verdade fundamental de todas as grandes religiões do mundo. Creio que são todas concedidas por Deus e creio que eram necessárias para os povos a quem essas religiões foram reveladas. E creio que se pudéssemos todos ler as escrituras das diferentes fés, sob o ponto de vista de seus respectivos seguidores, haveríamos de descobrir que, no fundo, foram todas a mesma coisa e sempre úteis umas às outras."
"Aprenda como se você fosse viver para sempre. Viva como se você fosse morrer amanhã."
MAHATMA GANDHI